setembro 14, 2005

Katrina e a noção de "Risco"



Muita coisa se disse, por vezes de maneira pouco rigorosa, sobre o dimensionamento de Estruturas Especiais, tendo em conta fenómenos extraordinários. De seguida, tenta-se explicar o que é "risco" e como é considerado no projecto de estruturas.
As propriedades resistentes dos materiais, bem como as acções a que estão sujeitos, têm carácter aleatório, seguindo uma dada função de distribuição de probabilidade (normalmente, a Normal, passe a redundância). Neste contexto, os Regulamentos impõem, normalmente, que, de acordo com a distribuição, as propriedades resisitentes adoptadas em projecto sejam excedidas em 95%, ao passo que as acções podem ser excedidas, no máximo, em 5% dos casos (ou seja, trabalha-se com um nível de confiança de 90%). Estes são os chamados "valores característicos". Uma análise probabilística semi-directa (de nível II) poucas vezes é utilizadas, especialmente no caso de materiais muito estudados, como o aço ou o betão. Assim, são adoptados "coeficientes de segurança", obtido tendo em conta a variabilidade das grandezas envolvidas. Note-se que se a resistência e a solicitação fossem, cada uma, variáveis independentes, a probabilidade de rotura já seria baixa. Contudo, como estão envolvidos bastantes fenómenos aleatórios, mais baixa esta se torna.
Este é o risco aceite pela Comunidade como um todo, já que os Regulamentos são Decretos-Lei. Assim, é uma decisão de carácter político, baseada, como é óbvio, em critérios técnicos. Assim, é óbvio que a responsabilidade por se considerar, no caso dos diques de Nova Orleães, um furacão de classe 3 como acção de dimensionamento válida, tem que ser atribuída ao poder político.
A decisão, a posteriori, é muito fácil de criticar. As acções acidentais são contabilizadas tendo em conta os registos históricos e o risco aceite. Com os registos históricos, é possível construir uma função que caracteriza a acção. Neste ponto, é fundamental o conceito de período de retorno. O período de retorno de uma acção equivale ao intervalo de tempo, pela função de probabilidade, em que a valor considerado não é excedido. Ou seja, quando um período de retorno toma o valor 500 anos, a acção não toma valores superiores nesse intervalo de tempo. Como título indicativo, refira-se que a acção sísmica regulamentar em Portugal tem um período de retorno de cerca de 1000 anos, ou seja, o dimensionamento das estruturas correntes é feito tendo em conta um sismo de magnitude bem maior que o de 1755 (o que se explica por o risco aceite pela Comunidade ser muito pequeno). Em barragens, não é raro usar 5000 ou 10000 anos.
Custa-me a crer que se tenha considerado períodos de retorno tão grandes nos diques de Nova Orleães...

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